Chamada:
(…) Entre ex-cônjuges ou ex-companheiros, desfeitos os laços afetivos e familiares, a obrigação de pagar alimentos é excepcional, de modo que, quando devidos, ostentam, ordinariamente, caráter assistencial e transitório, persistindo apenas pelo prazo necessário e suficiente ao soerguimento do alimentado, com sua reinserção no mercado de trabalho ou, de outra forma, com seu autossustento e autonomia financeira.
Jurisprudência na íntegra:
Agravo de Instrumento n. 4017479-02.2017.8.24.0000, da Capital – Eduardo Luz
Relatora: Desembargadora Rosane Portella Wolff
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL CUMULADA COM PARTILHA DE BENS E ALIMENTOS COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA. JUÍZO DE ORIGEM QUE FIXA ALIMENTOS EM FAVOR DA AUTORA, NO VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO. INSURGÊNCIA DO RÉU.
PRETENSÃO DE FIXAÇÃO DE PERÍODO DE VIGÊNCIA DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR. ALIMENTOS ENTRE EX-CONVIVENTES. HIPÓTESE EXCEPCIONAL E TRANSITÓRIA QUE SE DESTINA AO ABRANDAMENTO DA READEQUAÇÃO FINANCEIRA DO EX-COMPANHEIRO E A SUA REINSERÇÃO NO MERCADO DE TRABALHO, SE FOR O CASO. SITUAÇÃO EM EXAME NA QUAL SE APUROU A EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE QUE A AGRAVADA TENHA SE REINSERIDO NO MERCADO DE TRABALHO. INCAPACIDADE LABORAL QUE NÃO MAIS SUBSISTE. NECESSIDADE DE FIXAÇÃO DE PRAZO PARA PAGAMENTO DA PENSÃO ALIMENTÍCIA PELO PRAZO DE 1 (UM) ANO, A CONTAR DA PUBLICAÇÃO DO ACÓRDÃO DA PENSÃO ALIMENTÍCIA, EM RAZÃO DA NATUREZA EMERGENCIAL, TRANSITÓRIA E EXCEPCIONAL DA VERBA. DECISÃO REFORMADA.
“Entre ex-cônjuges ou ex-companheiros, desfeitos os laços afetivos e familiares, a obrigação de pagar alimentos é excepcional, de modo que, quando devidos, ostentam, ordinariamente, caráter assistencial e transitório, persistindo apenas pelo prazo necessário e suficiente ao soerguimento do alimentado, com sua reinserção no mercado de trabalho ou, de outra forma, com seu autossustento e autonomia financeira.” (REsp 1454263/CE, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 16-4-2015).
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n. 4017479-02.2017.8.24.0000, da comarca da Capital – Eduardo Luz 2ª Vara da Família em que são Agravante F. A. C. e Agravada S. C. H.
A Quarta Câmara de Direito Civil decidiu, por unanimidade, conhecer do Recurso e dar-lhe parcial provimento. Custas legais.
O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Joel Dias Figueira Júnior, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Rodolfo C. R. S. Tridapalli.
Florianópolis, 28 de junho de 2018.
Desembargadora Rosane Portella Wolff
Relatora
RELATÓRIO
F.A.C. interpôs Agravo de Instrumento em face da decisão prolatada pelo magistrado Flávio André Paz de Brum, na Ação de Reconhecimento e Dissolução de União Estável cumulada com Partilha de Bens e Alimentos com Pedido de Tutela de Urgência n. 0301407-50.2017.8.24.0091, proposta em seu desfavor por S.C.H., na 2ª Vara da Família da comarca da Capital, que fixou pensão alimentícia em favor da Agravada no valor de um salário mínimo mensal sem limitação de vigência (pp. 200-202 do processo principal), sendo a decisão confirmada nos Embargos de Declaração de n. 0003126-43.2017.8.24.0091.
Em suas razões recursais (pp. 1-14), sustentou, em síntese, que: a) o documento apresentado pela Recorrida acerca de suposto acordo extrajudicial de alimento é falso, sendo que houve apropriação da Agravada do valor transferido da conta corrente da pessoa jurídica do Agravante; b) não concorda com o pagamento de alimentos em favor da Adversa; c) não houve fixação do prazo de vigência da verba alimentar; d) não há provas das alegadas doenças, sendo que os documentos exibidos pela Recorrida tratam-se de relatórios de consultas médicas e exames realizados e nada há que demonstre incapacidade física; e e) a Adversa possui capacidade laboral, sempre trabalhou durante a união e deve ser estabelecido limite da vigência da obrigação, “até para incentivar a Agravada a buscar seu próprio sustento”.
Por fim, requereu a antecipação da tutela recursal e, ao final, o provimento do Reclamo para estabelecer a vigência da obrigação alimentar pelo período de doze meses contados do arbitramento judicial da pensão alimentícia.
No âmbito da Câmara Civil Especial, o Desembargador José Agenor de Aragão deferiu em parte o pedido de antecipação de tutela recursal para ordenar que o pagamento dos alimentos se dê até o julgamento pela Câmara Especializada (pp. 24-28).
Intimada, a parte Agravada não apresentou contraminuta (p. 31).
Enviados os autos à Procuradoria-Geral da Justiça, o Procurador Tycho Brahe Fernandes manifestou-se pela desnecessidade de intervenção Ministerial no feito (p. 36).
Após, vieram os autos conclusos.
É o necessário relato.
VOTO
Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conhece-se do Recurso.
Trata-se de Insurgência do Réu em face da decisão proferida pelo Juízo da origem que fixou pensão alimentícia em favor da Autora, sem delimitação do prazo de vigência dos alimentos.
Quanto à obrigação alimentar, sabe-se que sua previsão legal encontra-se no Código Civil, no seguinte dispositivo:
Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.
§ 1º Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.
§ 2º Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia.
Além disso, o Código estabelece uma relação de proporcionalidade entre as necessidades do pleiteante e a possibilidade do prestador de alimentos, nos seguintes termos: “São devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento” (art. 1.695).
Não se olvida, ainda, que os alimentos devidos entre ex-conviventes possuem caráter excepcional e transitório, de modo a oportunizar que o consorte desfavorecido se restabeleça financeiramente após a dissolução do vínculo afetivo.
Consoante a interpretação conjunta das disposições retro expostas, tem-se, então, que o balizamento da prestação alimentar se apoia na tríade: necessidade-possibilidade-proporcionalidade, além de ser medida excepcional e transitória.
A propósito:
PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA. ART. 535 DO CPC.
VIOLAÇÃO NÃO CONFIGURADA. ALIMENTOS TRANSITÓRIOS DEVIDOS ENTRE EX-COMPANHEIROS.
1. Não se viabiliza o recurso especial pela indicada violação do artigo 535 do Código de Processo Civil. Isso porque, embora rejeitados os embargos de declaração, a matéria em exame foi devidamente enfrentada pelo Tribunal de origem, que emitiu pronunciamento de forma fundamentada, ainda que em sentido contrário à pretensão do recorrente.
2. Entre ex-cônjuges ou ex-companheiros, desfeitos os laços afetivos e familiares, a obrigação de pagar alimentos é excepcional, de modo que, quando devidos, ostentam, ordinariamente, caráter assistencial e transitório, persistindo apenas pelo prazo necessário e suficiente ao soerguimento do alimentado, com sua reinserção no mercado de trabalho ou, de outra forma, com seu autossustento e autonomia financeira.
3. As exceções a esse entendimento se verificam, por exemplo, nas hipóteses em que o ex-parceiro alimentado não dispõe de reais condições de reinserção no mercado de trabalho e, de resto, de readquirir sua autonomia financeira. É o caso de vínculo conjugal desfeito quando um dos cônjuges ou companheiros encontra-se em idade já avançada e, na prática, não empregável, ou com problemas graves de saúde, situações não presentes nos autos. Precedentes de ambas as Turmas de Direito Privado desta Corte.
4. Os alimentos transitórios – que não se confundem com os alimentos provisórios – têm por objetivo estabelecer um marco final para que o alimentando não permaneça em eterno estado de dependência do ex-cônjuge ou ex-companheiro, isso quando lhe é possível assumir sua própria vida de modo autônomo.
5. Recurso especial provido em parte. Fixação de alimentos transitórios em quatro salários mínimos por dois anos a contar da publicação deste acórdão, ficando afastada a multa aplicada com base no art. 538 do CPC.
(REsp 1454263/CE, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 16-4/-2015, DJe 08/05/2015 – com destaques).
Nos casos em que se visualize o preenchimento dos requisitos supracitados, a jurisprudência desta Corte limita a verba alimentar ao ex-cônjuge ou ex-companheiro por período não superior a 1 (um) ano, conforme o caso, período suficiente para a sua estabilização e readequação financeira.
Neste sentido:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE DIVÓRCIO. DECISÃO AGRAVADA QUE ESTABELECEU A GUARDA COMPARTILHADA, FIXOU OS ALIMENTOS PROVISÓRIOS AOS FILHOS EM SETE SALÁRIOS MÍNIMOS E INDEFERIU A PRETENSÃO ALIMENTAR QUANTO À EX-ESPOSA. RECURSO DA PARTE (…) ALIMENTOS OBRIGAÇÃO ALIMENTAR DEVIDA ENTRE EX-CÔNJUGES. DEVER DE MÚTUA ASSISTÊNCIA. AGRAVANTE JOVEM E COM QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL. DOCUMENTOS JUNTADOS AOS AUTOS QUE REVELAM, ENTRETANTO, A NECESSIDADE DE FIXAÇÃO DOS ALIMENTOS PELO PERÍODO DE UM ANO, A FIM DE AUXILIAR SUA REINSERÇÃO NO MERCADO DE TRABALHO. POSSIBILIDADES DO ALIMENTANTE EVIDENCIADAS. (…) RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
(Agravo de Instrumento n. 4002785-91.2018.8.24.0000, rel. Des. Cláudia Lambert de Faria, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 15-5-2018 – sublinhou-se).
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL C/C ALIMENTOS. INTERLOCUTÓRIO QUE, APÓS FIXA-LA EM 04 (QUATRO) SALÁRIOS MÍNIMOS, REDUZIU A VERBA ALIMENTAR ARBITRADA EM FAVOR DA EX-COMPANHEIRA PARA 02 (DOIS) PISOS E, BEM ASSIM, LIMITOU A VIGÊNCIA DA OBRIGAÇÃO PARA O PRAZO DE 12 (DOZE) MESES. INSURGÊNCIA DA ALIMENTANDA. POSTULANTE QUE, CONQUANTO SE ENCONTRE DESEMPREGADA, É JOVEM (44 ANOS), SAUDÁVEL E POSSUI EXPERIÊNCIA LABORATIVA (COMERCIÁRIA). ADEMAIS, AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE QUE O VALOR PECUNIÁRIO IMPOSTO É INSUFICIENTE PARA O SEU SUSTENTO. PRESTAÇÕES DE SEU NOVO VEÍCULO ARCADAS INTEGRALMENTE PELO VARÃO. DESPESAS COM A FILHA DO CASAL E A ENTEADA DO EX-COMPANHEIRO TAMBÉM ASSUMIDAS POR ELE. MONTANTE ASSISTENCIAL ARBITRADO, POIS, DE ACORDO COM O TRINÔMIO LEGAL (CC ARTS. 1.694, CAPUT E 1.695, § 1º). RECORRENTE QUE PUGNA, AINDA, PELA DILAÇÃO DO PRAZO DA OBRIGAÇÃO. PERÍODO ESTIPULADO, CONTUDO, QUE SE MOSTRA RAZOÁVEL E ADEQUADO PARA QUE A AUTORA SE REINSIRA NO MERCADO DE TRABALHO. DECISÃO ACERTADA. RECURSO DESPROVIDO.
(Agravo de Instrumento n. 2015.059238-9, rel. Des. Eládio Torret Rocha, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 11-02-2016 – com destaque).
No caso em exame, observa-se que durante o período da união estável a Agravada desenvolvida atividade laborativa, apesar de alegar que já possuía alguns problemas de saúde, sendo que após o seu térmico teria desenvolvido fibromialgia e depressão, as quais comprometeriam a sua capacidade para o trabalho, aliás, tal circunstância foi um dos fundamentos da decisão atacada para estipular a verba alimentar.
Entretanto, vislumbra-se dos autos que a Recorrida possui 50 (cinquenta) anos, não sendo pessoa com idade avançada, e há indícios de que já tenha se reinserido no mercado de trabalho, consoante documento de pp. 472-476 dos autos da origem, o que demonstra que a incapacidade laboral existente até agosto de 2017 (p. 445 do processo principal), e que ensejou o arbitramento da verba alimentar sem fixação de prazo para cumprimento, não mais subsiste, de modo que a finalidade da verba alimentar foi alcançada, não devendo persistir de forma vitalícia.
Sendo assim, mostra-se razoável que a pensão alimentícia tenha vigência pelo período de doze meses a contar da publicação deste acórdão, o qual é suficiente para o restabelecimento financeiro da Recorrida, diante das notícias de que já deu início ao desenvolvimento de atividade laborativa.
Esclarece-se que tal lapso temporal mostra-se como necessário, isso porque havia indícios nos autos de que por certo período a Agravada não detinha condições para o trabalho, tendo-se notícias de que recentemente se reinseriu no mercado de trabalho.
Dessarte, é de rigor a reforma da decisão da origem para fixar o prazo de vigência da obrigação alimentar em favor da Autora em um ano a contar da publicação deste julgamento.
Por fim, salienta-se que o Juízo da origem poderá rever a decisão, a qualquer momento, caso sejam exibidas nos autos ou se apure durante a instrução probatória provas cabais que ensejam a manutenção da verba por período superior.
Este é o voto.
Ante o exposto, por unanimidade, conhece-se do Agravo de Instrumento e dá-se-lhe parcial provimento para estipular a vigência da pensão alimentícia fixada em favor da Agravada em um ano, a contar da publicação deste julgamento.
Gabinete Desembargadora Rosane Portella Wolff
Ementa na Íntegra:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL CUMULADA COM PARTILHA DE BENS E ALIMENTOS COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA. JUÍZO DE ORIGEM QUE FIXA ALIMENTOS EM FAVOR DA AUTORA, NO VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO. INSURGÊNCIA DO RÉU. PRETENSÃO DE FIXAÇÃO DE PERÍODO DE VIGÊNCIA DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR. ALIMENTOS ENTRE EX-CONVIVENTES. HIPÓTESE EXCEPCIONAL E TRANSITÓRIA QUE SE DESTINA AO ABRANDAMENTO DA READEQUAÇÃO FINANCEIRA DO EX-COMPANHEIRO E A SUA REINSERÇÃO NO MERCADO DE TRABALHO, SE FOR O CASO. SITUAÇÃO EM EXAME NA QUAL SE APUROU A EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE QUE A AGRAVADA TENHA SE REINSERIDO NO MERCADO DE TRABALHO. INCAPACIDADE LABORAL QUE NÃO MAIS SUBSISTE. NECESSIDADE DE FIXAÇÃO DE PRAZO PARA PAGAMENTO DA PENSÃO ALIMENTÍCIA PELO PRAZO DE 1 (UM) ANO, A CONTAR DA PUBLICAÇÃO DO ACÓRDÃO DA PENSÃO ALIMENTÍCIA, EM RAZÃO DA NATUREZA EMERGENCIAL, TRANSITÓRIA E EXCEPCIONAL DA VERBA. DECISÃO REFORMADA. “Entre ex-cônjuges ou ex-companheiros, desfeitos os laços afetivos e familiares, a obrigação de pagar alimentos é excepcional, de modo que, quando devidos, ostentam, ordinariamente, caráter assistencial e transitório, persistindo apenas pelo prazo necessário e suficiente ao soerguimento do alimentado, com sua reinserção no mercado de trabalho ou, de outra forma, com seu autossustento e autonomia financeira.” (REsp 1454263/CE, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 16-4-2015). RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
(TJ-SC – AI: 40174790220178240000 Capital 4017479-02.2017.8.24.0000, Relator: Rosane Portella Wolff, Data de Julgamento: 28/06/2018, Quarta Câmara de Direito Civil)