Chamada:
(…) Se a discussão não circunda o vício formal no registro público realizado, mas a existência de vício na declaração de vontade realizada no período de convivência, a competência para processar e julgar o feito é do juízo de família.
Jurisprudência na Íntegra:
Poder Judiciário da União
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS
TERRITÓRIOS
Órgão 6ª Turma Cível
Processo N. AGRAVO DE INSTRUMENTO 0709592-31.2018.8.07.0000
AGRAVANTE (S) LILIAN CHRYSTIAN ALMEIDA CAETANO
AGRAVADO (S) RODRIGO PEREIRA REINALDO DE SOUZA
Relator Desembargador CARLOS RODRIGUES
Acórdão Nº 1120183
EMENTA
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECONVENÇÃO. VARA DE FAMÍLIA. ANULAÇÃO DE
ESCRITURA PÚBLICA. RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL.
COMPETÊNCIA DO JUÍZO DE FAMÍLIA. AGRAVO PROVIDO.
1) Compete às Varas de Família processar e julgar processos que envolvam ações decorrentes do art. 226 da Constituição Federal, tais como o reconhecimento e dissolução de união estável.
2) Se a discussão não circunda o vício formal no registro público realizado, mas a existência de vício na declaração de vontade realizada no período de convivência, a competência para processar e julgar o feito é do juízo de família.
3) Recurso conhecido e provido.
ACÓRDÃO
ANDRIGHI – 2º Vogal, sob a Presidência do Senhor Desembargador ALFEU MACHADO, em
proferir a seguinte decisão: CONHECIDO. PROVIDO. UNÂNIME., de acordo com a ata do
julgamento e notas taquigráficas.
Brasília (DF), 22 de Agosto de 2018
Desembargador CARLOS RODRIGUES
Relator
RELATÓRIO
Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto por LILIAN
CHRYSTIAN ALMEIDA CAETANA contra a decisão proferida pelo juízo da Vara de Família e de
Órfãos e Sucessões de Águas Claras que, em pedido de reconhecimento e dissolução de união estável autuado sob o nº 0006452-77.2016.8.07.0007, proposto por RODRIGO PEREIRA REINALDO DE
SOUZA em desfavor da agravante, extinguiu a reconvenção em razão da incompetência.
Em suas razões recursais, discorre sobre o período de convivência das partes. Afirma que a Vara de
Família é a competente para processar e julgar a reconvenção, com base no entendimento deste e.
Tribunal. Sustenta que havia decisão anterior do mesmo juízo admitindo a competência. Alega que a
prolação da decisão na audiência de instrução, quando testemunhas foram deslocadas inclusive de
outros Estados da Federação, foi realizada sem sua manifestação prévia. Invoca a nulidade do comando por violação aos princípios do contraditório e da cooperação.
Colaciona precedentes e busca, liminarmente, a concessão de efeito suspensivo ao recurso. No mérito, pleiteia a declaração de nulidade da decisão agravada, com o novo recebimento da reconvenção e a
reabertura da instrução processual.
Gratuidade judiciária deferida na origem.
Por intermédio do despacho de id 4637019, determinou-se a juntada dos documentos obrigatórios
previstos no artigo 1.017, I, do Código de Processo Civil.
Em resposta, a parte juntou a petição e documentos de id 4652965 e seguintes.
Concedido o efeito suspensivo ao recurso sobrestando a marcha processual na origem até julgamento
colegiado em decisão de id. 4673485.
Em contrarrazões apresentadas no id. 4712350, o agravado defende a manutenção da decisão
combatida, alegando se tratar de caso de decadência, uma vez que se passaram mais de 10 (dez) anos
da lavratura da escritura, decaindo portanto o direito de alegar a nulidade do documento.
É o relatório.
O Senhor Desembargador CARLOS RODRIGUES – Relator
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
O presente recurso visa solucionar a controvérsia acerca da competência para processar e julgar a
reconvenção ajuizada pela agravante, que pretende anular a escritura pública de regulamentação
patrimonial na constância da união estável.
O art. 31, I a IV, da Lei n.º 11.697/2008, que dispõe acerca da competência do Juiz de Registros
Públicos, discorre o seguinte sobre o tema:
“Art. 31. Compete ao Juiz de Registros Públicos:
I – inspecionar os serviços notariais e de registro, velando pela observância das prescrições legais e normativas, e representar ao Corregedor quando for o caso de aplicação de penalidades
disciplinares;
II – baixar atos normativos relacionados à execução dos serviços notariais e de registro, ressalvada a competência do Corregedor;
III – processar e julgar as questões contenciosas e administrativas que se refiram diretamente a atos de registros públicos e notariais em si mesmos; (Negritei.)
IV – fixar orientação no tocante à escrituração de livros, execução e desenvolvimento dos serviços,
segundo normas estabelecidas pela Corregedoria-Geral da Justiça.
Na hipótese em apreço, LILIAN CHRISTIAN DE ALMEIRA CAETANA ofertou reconvenção em
face de RODRIGO PEREIRA REINALDO DE SOUZA alegando, em síntese, que a escritura pública trazida a lume está maculada pelos vícios de consentimento, firmado sob a égide de agressões físicas, morais e diversas ameaças. Aduz que o documento contém inúmeras inverdades, inclusive no que
tange ao período da união.
Ocorre que, para decidir acerca da nulidade da Escritura Pública de Regulamentação Patrimonial na
Constância da União Estável, é necessário verificar a validade da declaração de vontade dos
outorgantes, e não apenas mero vício formal, conforme aduz a mencionada Lei de Organização
Judiciária do Distrito Federal.
A pretensão da Agravante é a de declarar a nulidade do registro por defeito ocorrido em virtude de
suposta existência de vício de vontade por parte de um dos declarantes, e não um defeito contido em si mesmo.
É necessário destacar que caso seja reconhecido o vício alegado, restará atingida toda a disposição
dos bens do casal regulamentada na escritura pública, tornando questionável, inclusive, o período da
referida união declarada, ocasionando por via reflexa a anulação da escritura pública lavrada.
Assim, a considerando que a questão principal da reconvenção é o reconhecimento da existência de
vício na declaração de vontade de LILIAN CHRISTIAN DE ALMEIDA CAETANA, intrinsecamente ligada com as provas a serem produzidas na demanda de reconhecimento e dissolução de União
Estável, não deve prevalecer a extinção da reconvenção por incompetência do Juízo. Se a discussão
não circunda o registro público “em si mesmo”, como preconiza a lei, é o Juízo da Vara de Família o competente para processar e julgar a reconvenção proposta, principalmente ponderando que a
nulidade do registro não é causa, mas apenas efeito do eventual defeito na manifestação de vontade da agravante, acaso seja reconhecido tal vício.
Aliás, trata-se de questão eminentemente contenciosa, que escapa da competência administrativa da
Vara de Registros Públicos.
Ainda, o Juízo de Família se mostra o competente para processar e julgar a reconvenção, haja vista
que o ato jurídico que se pretende anular por suposto vício de consentimento veicula, na sua
essência, matérias que se inserem no âmbito da competência do Juiz de Família , conforme
preceitua o art. 27, I, ‘a’ e ‘e’, e II, da Lei de Organização Judiciária do Distrito Federal.
Outro não é o entendimento deste Tribunal a respeito do tema:
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. VARA DE FAMÍLIA. VARA DE REGISTROS
PUBLICOS. AÇÃO DE CONHECIMENTO. NULIDADE. ESCRITURA PÚBLICA DECLARATÓRIA DE UNIÃO ESTÁVEL. AUSÊNCIA DE DISCERNIMENTO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DE
FAMÍLIA
I – O Juiz de Registros Públicos não é competente para processar e julgar a ação de conhecimento
objetivando a anulação de escritura pública declaratória de união estável por suposto vício na
manifestação de vontade, porquanto a eventual desconstituição do ato jurídico passa necessariamente pelo exame da validade da declaração nele externada, circunstância que demonstra que não se trata de defeito de ato notarial em si mesmo. Inteligência do art. 31, III, da Lei nº 11.697/2008.
II – O ato jurídico que se pretende anular por suposta ausência de discernimento para dispor sobre a existência união estável veicula, na sua essência, matérias que se inserem no âmbito da competência do Juiz de Família, pois compete ao referido juízo conhecer de questões relacionadas à capacidade
das pessoas, bem como as relativas ao reconhecimento de união estável. Art. 27, I, ‘a’ e ‘e’, e II, da
Lei de Organização Judiciária do Distrito Federal.
III – Declarou-se competente o Juízo da 4ª Vara de Família, Órfãos e Sucessões de Ceilândia.
(Acórdão n.604071, 20120020140519CCP, Relator: JOSÉ DIVINO DE OLIVEIRA 2ª Câmara Cível, Data de Julgamento: 16/07/2012, Publicado no DJE: 20/07/2012. Pág.: 48)
PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO DECLARATÓRIA DE
NULIDADE. ESCRITURAPÚBLICA. UNIÃO ESTÁVEL. CONTEÚDO DAS DECLARAÇÕES
ANOTADAS EM INSTRUMENTO PÚBLICO. VERACIDADE CONTESTADA. EFICÁCIA
DESCONSTITUTIVA. JUÍZO DE FAMÍLIA.
1.O artigo 9.º da Lei 9.278/96 – que regulamenta o artigo 226, parágrafo 3.º, da Constituição Federal – estabelece que toda a matéria relativa à união estávelé de competênciado Juízo da Vara de
Família, razão pela qual se compreende que, inclusive, as ações anulatórias de escriturapública
declaratória de união estável, quando ajuizadas com o propósito de questionar a veracidade do
conteúdo declarado no instrumento público a respeito da situação fática capaz de configurar a união estável, devem nele ser processadas e julgadas.
2.Afirmada a competênciaespecializada da Vara de Família para processar e julgar o feito que traz
em seu bojo matéria relativa à união estável, afasta-se a competênciada Vara Cível, que sabidamente é residual, consoante apregoa o artigo 25 da Lei de Organização Judiciária do Distrito Federal.
3.Conflito conhecido e acolhido, declarando-se competente o Juízo suscitado. Unânime.
(Acórdão n.1015542, 07010846720168070000, Relator: TEÓFILO CAETANO 1ª Câmara Cível,
Data de Julgamento: 10/05/2017, Publicado no DJE: 18/05/2017. Pág.: Sem Página Cadastrada.).
DE ESCRITURA PÚBLICA – RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL -SOBREPARTILHA – COMPETÊNCIA DO JUÍZO DE FAMÍLIA -CONFLITO PROCEDENTE
1)- Tratando-se de ação declaratória de nulidade de escritura pública de união estável c/c
reconhecimento, dissolução de união estável e sobrepartilha, cujos motivos para se buscar a
anulação da escritura pública se confundem com a prova a ser produzida na ação de reconhecimento e dissolução da união, pois se busca demonstrar ser inverídica a informação sobre o período da
união consignado na escritura, compete ao juízo de família processar e julgar os pedidos.
2) – Compete às Varas de Família processar e julgar processos que envolvam ações decorrentes do
art. 226 da Constituição Federal, tais como o reconhecimento e dissolução de união estável.
3) – Conflito conhecido, com declaração de competência do juízo suscitado.
(Acórdão n.634956, 20120020232426CCP, Relator: LUCIANO MOREIRA VASCONCELLOS 1ª
Câmara Cível, Data de Julgamento: 19/11/2012, Publicado no DJE: 21/11/2012. Pág.: 54)
Feitas tais considerações, DOU PROVIMENTO AO RECURSO para anular a decisão combatida no que tange à extinção a reconvenção e determinar a retomada da marcha processual para assim
viabilizar o processamento e julgamento do pleito reconvencional.
É como voto.
O Senhor Desembargador JOSÉ DIVINO – 1º Vogal
Com o relator
A Senhora Desembargadora VERA ANDRIGHI – 2º Vogal
Com o relator
DECISÃO
CONHECIDO. PROVIDO. UNÂNIME.
Ementa na Íntegra:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECONVENÇÃO. VARA DE FAMÍLIA. ANULAÇÃO DE ESCRITURA PÚBLICA. RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DE FAMÍLIA. AGRAVO PROVIDO. 1) Compete às Varas de Família processar e julgar processos que envolvam ações decorrentes do art. 226 da Constituição Federal, tais como o reconhecimento e dissolução de união estável. 2) Se a discussão não circunda o vício formal no registro público realizado, mas a existência de vício na declaração de vontade realizada no período de convivência, a competência para processar e julgar o feito é do juízo de família. 3) Recurso conhecido e provido.
(TJ-DF 07095923120188070000 DF 0709592-31.2018.8.07.0000, Relator: CARLOS RODRIGUES, Data de Julgamento: 29/08/2018, 6ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 11/09/2018 . Pág.: Sem Página Cadastrada.)